Este blogger contém o registro dos processos de trabalho em ateliê para a execução e montagem do Projeto Ressonâncias III.

A edição brasileira do projeto é resultado da oficina ministrada por alunos do Programa de Pós-Graduação do Instituto de Artes da Unesp - SP, sob a orientação da artista da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, Dra. Virgínia Fróis, realizado em parceria com alunos na Universidade Federal de São João Del-Rei - MG. Com a curadoria e organização das Professoras Dra. Lalada Dalglish- UNESP - SP e Dra. Zandra Coelho de Miranda - UFSJ-MG

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This blogger contains the record of work processes in the studio for the implementation and installation of the Ressonâncias III project.The Brazilian edition of the project is the result of the workshop conducted by students of the Post Graduate Institute of Arts UNESP - SP, under the guidance of the artist's Faculty of Fine Arts, University of Lisbon, Dr. Virginia Fróis, conducted in partnership with students at the Federal University of São João Del Rei - MG.

The curation and organization, were the responsibility of the teachers Dr. Lalada Dalglish - UNESP - SP and Dr. Zandra Coelho Miranda - UFSJ - MG

sexta-feira, 5 de julho de 2013

RESSONÂNCIAS - por Virgínia Fróis

Virgínia Fróis, Instituto de Artes-UNESP-SP, 08 de agosto de 2012.

Este projeto das RESSONÂNCIAS em SP, foi uma partilha, um estender a outros, uma questão  que sendo a minha, certamente é comum aos humanos.
Partirá da vossa disponibilidade para trabalhar as vossas questões interiores.

Assim a proposta é produzir uma peça com todos, ser uma partilha. Partiremos da cabeça como objeto a trabalhar, como forma. A aprendizagem da técnica da conformação sucessiva,  da repetição, das relações com as matérias, como meios, com os processo ou com o objeto final.
Uma aprendizagem que vem do corpo e com o corpo. A vossa cabeça é o modelo, as mãos dão forma, modelam e no acabar acariciam e devolvem à cabeça um pensamento feito desse estar no colo, silencioso e individual.
Partimos de uma idéia antiga. Entendo Ressonância como a relação com um outro. Uma coisa nossa que ressoa no outro (identificação) e que retorna mais clara ou por vezes mais complexa.

Comecei a desenvolver as idéias a partir de uma obra que fiz para uma exposição na Casa das Artes Jorge Vieira, alguns anos após a morte do escultor. Fiz duas cabeças-urna suspensas.
O Jorge Vieira, foi um Professor com quem iniciei o meu trabalho como docente na Faculdade de Belas Artes de Lisboa. Fui sua assistente, quando ele já estava já no final da sua carreira docente. Nunca fui sua aluna mas conhecia bem a sua obra. Ele era uma pessoa muito especial, com quem aprendi muito. Desses anos ficou uma boa amizade. 
No dia em que ele morreu (dezembro de 1998) eu inaugurava uma exposição com o titulo MORADAS.
A ultima peça que realizei para essa exposição era uma urna que se apresentou suspensa do teto, a minha primeira peça suspensa. Esta peça foi modelada na praia, com o barro retirado de numa falésia junto ao mar, num período de férias: via o mar, sentia o calor no meu corpo e na sombra,  pensava ao modelar os potes, que as cinzas de um corpo cabiam dentro de um volume igual à nossa caixa crâniana.

Depois em 2005 publicava num livro de homenagem a Jorge Vieira, nos 10 anos do museu este texto:

Uma assinatura em espiral (*)

Sobre a areia
 a assinatura,
o movimento do meu corpo evoca a vida .

No ar a matéria volatiliza-se em helicoidais de calor e fumo.
No dia claro e límpido,
os pés quentes percorriam a areia, sentiam a água gelada.

Alguma cinza
No interior do vaso do tamanho da cabeça de um homem
O pó fino e leve
De um corpo inteiro.

Na urna de terra cota, guardo a memória do prazer da vida.

No profundo Mar
dorme o vaso,
sais,
minerais,
silicatos, carbonatos e nada mais.

(*) Nas 1º anos  as obras dos do escultor JV eram assinadas com uma espiral

É nesta sequência de associações que realizei o par de cabeças-urna expostas e no Museu Jorge Vieira.
Depois comecei a desenvolver a idéia para a peça Ressonâncias, cerca de 2 anos ensaiando compreendendo o que fazia. Comecei por fazer o molde em gesso da minha cabeça, depois de dentro dele tirar o positivo em cera e depois em terracota e por fim realizar os moldes-cápsulas em terracota.   Assim configurando a 1ª peça (RESSONÂNCIA I) uma roda de 9  Moldes- Urna, agora designadas de CAPSULAS, terracota selada com cera  de abelha.
 Aqui a escultura, a idéia de origem, a idéia de matriz, o processo mais tradicional, que leva ao resultado final em bronze ou em cerâmica, os materiais e processos técnicos, começaram também a ser metáforas da obra. Uma reflexão  que se apropria do processo da escultura para a tornar em metáfora.  A criação: vida e  morte, num contínuo ciclo de arte e vida.

 A idéia de nascimento e morte faz parte da nossa condição e, portanto nesta peça a idéia de vazio,  evoca  os nossos processos de crescimento.  Os vazios que se vão criando ao longo da vida, as expectativas e o não resolvido.  Acredito que as mulheres guardam muitas coisas não resolvidas como nódulos, pequenos traumas, dentro de si, coisas que eventualmente foram emoções fortes, vitais.
É muitas vezes essa a matéria da arte. Nódulos, vazios, espaços inacessíveis, que podem  ser usados como espaços potenciais para o desenvolvimento  da criação artística, aos quais acedemos de forma muitas vezes intuitiva dentro dos processos de trabalho.

Assim é isto que compartilho convosco, é este o centro deste trabalho, a Ressonância.

Quando iniciarem e já com a vossa cabeça na mão: uma máscara funerária, a cópia tridimensional , como nunca a viram ou tocaram,  uma forma tão crua e inesperada. Teremos aí um 1º momento de confrontação: o tamanho da cabeça, as sua formas. Uma estranheza deparamos com uma coisa sem expressão, mais real as nossas cabeças, uma coisa morta.

É  neste momento  que tudo começa. Um questionamento sobre nós, sobre o corpo, sobre o tempo e sobre a vida.
O que se pretende é que o processo seja gerador de questionamentos internos que depois ajudem a um crescimento pessoal, individual. O que eu penso que este processo vos vai dar é o exercício da reflexão  e da superação,  com dizia o poeta João Cabral Neto em Morte e vida Severina:  “saltar para dentro da vida, dar o seu primeiro grito....”
Um renascer, um emergir , leve e alegre.


ZAMBRANO, Maria (2005). O sonho criador, Lisboa: Assírio & Alvim

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